Amizade

O que consideramos como amizade? Qual o verdadeiro valor? Com que base estabelecemos nossas relações de amizade? O que é um amigo para mim? Quem são meus amigos? São verdadeiros?

Amigo é aquela pessoa que que nos dá atenção, quando estamos carentes? Que nos escuta, quando precisamos desabafar? Ou que nos faz companhia, quando necessitamos?

Isso não é amizade, isso é uso do outro! Isso é interesse!

Se eu estabeleço relações de amizade por carência, por desejos meus ou para preencher coisas que eu quero, eu uso o outro apenas como um meio.

Se eu tenho amizade com alguém porque ele tem dinheiro e pode me beneficiar e vai que eu preciso em algum momento… isto não é amizade, é um plano de previdência privada.

Eu cultivo amizade com esta pessoa porque ela é influente e pode me arrumar um emprego ou pode me apresentar alguém. Isto não é amizade, é comércio.

Infelizmente nos dias de hoje estabelecemos as relações de amizade não pelas necessidades humanas de troca, de compartilhamento, mas sim para suprir nossas carências, nossos desejos.

Usamos o outro para preencher nosso vazio interior, para preencher coisas que eu desejo e aí a amizade não é um fim em si mesma, ela é um meio que me serve.

Immanuel Kant, filósofo alemão do século XVIII, um dos principais pensadores modernos já dizia que usar o ser humano como meio é imoral. Esta manipulação de usar o outro como meio, como se nós fossemos mais importantes e as demais pessoas tivessem a obrigação de nos atender, de satisfazer nossas vontades, isso é manipulação, isso é típico dos egoístas.

Vivemos num mundo onde o egoísmo é cultivado. Vivemos em busca de atingir objetivos, daquilo que é bom para mim e mais ninguém. O egoísmo gera uma desumanização entre os homens.

E o homem egoísta é um terrível solitário. Ele não consegue perceber o outro, sentir o outro, não consegue despertar sentimentos verdadeiros, não consegue estabelecer relações profundas. Ele só manipula o outro.

A amizade é capaz de fazer nascer no coração do homem um tipo de amor que só existe nas amizades verdadeiras, somente nelas se cria o ambiente para que este tipo de amor floresça.

Um amor que não está contaminado com relações de poder, onde não há uso do outro como meio. Ninguém está acima de ninguém, estão no mesmo nível, não há interesses escusos em relações de verdadeira amizade.

Hoje não conseguimos enxergar a beleza da amizade, nós perdemos a capacidade das relações sacrificiais, abnegadas, altruístas e puras…  Relações onde não há interesses escusos, onde não há abuso, onde não há contabilidade de perdas e ganhos, onde nós temos prazer em partilhar, doar, em servir. E o que é isto senão Amor? Fraternidade.

O amigo é a resposta às nossas necessidades. Necessidades humanas e não aos desejos. A principal necessidade do ser humano, como ser humano é a Fraternidade. É pensar menos em si, pensar mais no outro, trabalhar para o todo, ser menos egoísta.

O amigo responde a esta necessidade de se humanizar; ele permite que através da presença dele você descubra um outro ser humano, em você. Nós nos encontramos uns nos outros, nós crescemos na convivência.

Mas para isto é preciso deixar de pensar tanto em si mesmo. Quanto mais o homem pensa apenas em si, mais se brutaliza, mais desperta instintos, caprichos, vaidades…. Quanto mais pensa no outro, mais cresce.

E o teu amigo te dá esta oportunidade de realizar-se como ser humano, através de uma amizade verdadeira, aquela que se baseia no amor fraterno, nos valores universais, pela pessoa em si, pelo que a pessoa é, pelo seu caráter, por aquilo que você é e não por aquilo que você pode dar. E é nessa relação entre iguais que se cria no nosso coração o ambiente favorável para nascer no um tipo de amor que chamamos de amizade.

Os gregos chamavam de phileo, diferente de eros que é o amor erótico e diferente de ágape que é o amor divino… Phileo é o amor da amizade, da verdadeira amizade.

Cícero dizia que a amizade verdadeira só existe entre homens de bem; homens que tem valores, sede de bondade, de verdade, de justiça…

Todo o homem de bem tem sede de valores e esta sede é que estabelece as verdadeiras relações: relações profundas. Se o homem não tem necessidade de bem, se não está faminto de valores, ele não estabelece relações profundas…. Porque é em função desta ideia que eles se unem e não em função de interesses superficiais.

A Amizade verdadeira torna o amigo mais lúcido, traz maior reflexão, traz à tona o que eu tenho de melhor. É uma relação de confiança, de lealdade, de amor, de respeito.

Os amigos nos lembram quem somos, fazem aflorar o melhor de nós. A amizade é o apoio, a base de propulsão para que você cresça como ser humano, para que você arremeta para cima. O verdadeiro amigo te protege das alienações que você sozinho não perceberia, não teria força moral para reagir. Ele é um elemento externo de consciência que te ajuda a pensar quando você não tem lucidez suficiente. Ele te dá oportunidade de ser muito maior do que você seria sozinho. Eis aí as verdadeiras relações humanas.

A amizade nos enriquece. O amigo é uma inspiração para que eu busque coisas belas, nobres e boas…para que eu não chegue diante dele de mãos vazias, nem de coração vazio…para que eu possa compartilhar o melhor de mim.

Para estabelecer relações profundas precisamos crescer como seres humanos. Se não crescermos, tudo será superficial. E homens superficiais estabelecem relações superficiais, pequenas, volúveis.

Cultivar estas relações profundas, estabelecer laços profundos, belos, que nos permitem dar sentido àVida. Isto é amizade!

Saber estabelecer estes laços é fundamental para que um dia possamos estabelecer laços muito profundos com a nossa própria alma, com nossa própria consciência, com o nosso Ser…

Cultivar estas relações nos permite estar mais em contato com nós mesmos, sermos profundos, sermos amigos da nossa própria alma. E assim crescermos como seres…humanos.

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